quinta-feira, junho 03, 2004
Deus e o sofrimento humano
Nos últimos dias tem-se discutido bastante por aí o sofrimento humano e a razão de ele ser permitido pelo Deus que nos criou.
O Zé Filipe cita páginas difíceis de von Horvath: 'Diz o padre: "Deus vai por todos os caminhos". Objecta o professor: "Como é que Deus pode passar pelo caminho em que vivem estas crianças miseráveis, vê-las e não as ajudar?" "Ele calou-se. Bebeu do seu vinho a lentos goles meditativos. Depois olhou-me de novo: 'Deus é o que há de mais terrível no mundo'". O professor ficou tão estupefacto que nem acreditou no que tinha ouvido. (...)Os acontecimentos são-nos incompreensíveis porque queremos julgá-los imediatamente, antes de lhes conhecermos todos os prolongamentos e consequências. Mas para Deus não há o "imediatamente" (...). Há o tempo todo, todo o passado, todo o presente, todo o futuro. E é isso que é terrível. "O mais terrível do mundo"'.
O Zé Manuel fala da “Gente que foi castigada pelo agreste do frio da montanha ou pela secura da planície. E que não consegue ver beleza onde há experiência de dor. É esse o estatuto de Deus nas nossas sociedades plurais: onde uns sentem a ferida do castigo sem explicação, outros vêem o incomensuravelmente bom.”
Para resolver isto o Tim cria um conceito novo para mim: a “omnimpotência” de Deus e diz que “se há sofrimento, o meu Deus ordena-me que tente já, aqui e agora, resolver esses problemas e não que espere pela visualização dos planos divinos”.
Concordo com tudo isto excepto com a “omnimpotência” de Deus. E recorro a sábias palavras do mesmo Timshel na última TdA: “o amor é um exercício de vontade”. Portanto, a simples realidade do Amor de Deus é em si mesmo uma acção actuante em nós, mesmo em situação de sofrimento.
Mas não é por acaso que a questão da teodicéia é profundamente perturbante para a fé dos crentes. Repescando umas palavras antigas aqui do Guia eu diria o seguinte:
Como é possível Deus existir se ele permite o sofrimento das suas criaturas? Faz parte dos pilares da minha Fé considerar Deus como nosso Pai, muito mais do que nosso Senhor. Como Pai, criou-nos à sua imagem e semelhança e como tal deu-nos liberdade plena para os nossos actos ou seja o poder de escolher o caminho como Ele o pode escolher. Acontece apenas que para essa liberdade ser plena, é necessário que o mundo à nossa volta, o nosso corpo, os outros, tudo o resto evolua também em liberdade. O princípio da incerteza de Heisenberg tem um significado profundamente teológico. O contraponto disto é que, assim, o mal, o sofrimento, a morte, existem à nossa volta e dentro de nós. Só desta forma a nossa liberdade tem verdadeiro sentido, só assim é real a capacidade de escolher que nos foi dada, só assim somos verdadeiramente filhos de Deus, só assim temos algo de divino em nós. Deus criou-nos como filhos para vivermos em liberdade e não numa redoma como mascotes. Aceitando isto podemos talvez perceber que o sofrimento não é um castigo nem a prova duma ausência, podemos talvez perceber que o sofrimento deve ser uma oportunidade de ter consciência da precaridade da nossa existência terrena, uma oportunidade de, tendo maior consciência da nossa condição humana, nos aproximarmos de Deus. Seguramente que esta consciência nos eleva e alivia o sofrimento. Mas em caso algum diminui a nossa responsabilidade de aliviar o sofrimento do próximo.
Teorias de quem nunca sofreu? Tenho boas razões para dizer que não. Razões minhas.
O Zé Filipe cita páginas difíceis de von Horvath: 'Diz o padre: "Deus vai por todos os caminhos". Objecta o professor: "Como é que Deus pode passar pelo caminho em que vivem estas crianças miseráveis, vê-las e não as ajudar?" "Ele calou-se. Bebeu do seu vinho a lentos goles meditativos. Depois olhou-me de novo: 'Deus é o que há de mais terrível no mundo'". O professor ficou tão estupefacto que nem acreditou no que tinha ouvido. (...)Os acontecimentos são-nos incompreensíveis porque queremos julgá-los imediatamente, antes de lhes conhecermos todos os prolongamentos e consequências. Mas para Deus não há o "imediatamente" (...). Há o tempo todo, todo o passado, todo o presente, todo o futuro. E é isso que é terrível. "O mais terrível do mundo"'.
O Zé Manuel fala da “Gente que foi castigada pelo agreste do frio da montanha ou pela secura da planície. E que não consegue ver beleza onde há experiência de dor. É esse o estatuto de Deus nas nossas sociedades plurais: onde uns sentem a ferida do castigo sem explicação, outros vêem o incomensuravelmente bom.”
Para resolver isto o Tim cria um conceito novo para mim: a “omnimpotência” de Deus e diz que “se há sofrimento, o meu Deus ordena-me que tente já, aqui e agora, resolver esses problemas e não que espere pela visualização dos planos divinos”.
Concordo com tudo isto excepto com a “omnimpotência” de Deus. E recorro a sábias palavras do mesmo Timshel na última TdA: “o amor é um exercício de vontade”. Portanto, a simples realidade do Amor de Deus é em si mesmo uma acção actuante em nós, mesmo em situação de sofrimento.
Mas não é por acaso que a questão da teodicéia é profundamente perturbante para a fé dos crentes. Repescando umas palavras antigas aqui do Guia eu diria o seguinte:
Como é possível Deus existir se ele permite o sofrimento das suas criaturas? Faz parte dos pilares da minha Fé considerar Deus como nosso Pai, muito mais do que nosso Senhor. Como Pai, criou-nos à sua imagem e semelhança e como tal deu-nos liberdade plena para os nossos actos ou seja o poder de escolher o caminho como Ele o pode escolher. Acontece apenas que para essa liberdade ser plena, é necessário que o mundo à nossa volta, o nosso corpo, os outros, tudo o resto evolua também em liberdade. O princípio da incerteza de Heisenberg tem um significado profundamente teológico. O contraponto disto é que, assim, o mal, o sofrimento, a morte, existem à nossa volta e dentro de nós. Só desta forma a nossa liberdade tem verdadeiro sentido, só assim é real a capacidade de escolher que nos foi dada, só assim somos verdadeiramente filhos de Deus, só assim temos algo de divino em nós. Deus criou-nos como filhos para vivermos em liberdade e não numa redoma como mascotes. Aceitando isto podemos talvez perceber que o sofrimento não é um castigo nem a prova duma ausência, podemos talvez perceber que o sofrimento deve ser uma oportunidade de ter consciência da precaridade da nossa existência terrena, uma oportunidade de, tendo maior consciência da nossa condição humana, nos aproximarmos de Deus. Seguramente que esta consciência nos eleva e alivia o sofrimento. Mas em caso algum diminui a nossa responsabilidade de aliviar o sofrimento do próximo.
Teorias de quem nunca sofreu? Tenho boas razões para dizer que não. Razões minhas.