quarta-feira, março 31, 2004
3x1=1
Já aqui falei bastante do Pai, que é a forma como entendo Deus. Já aqui falei do Filho, que é a forma como entendo o Amor de Deus. Mas do Espírito Santo pouco tenho falado. Durante muitos anos considerei-O como uma mera figura de estilo teológica, uma espécie de avatar cristão, invisível e insusceptível de descrição. Mais tarde aprendi a reconhecê-lo, na sua presença mas sobretudo na sua ausência. E hoje entendo-O como a inteligência de Deus em nós, algumas vezes presente, tantas vezes ausente, expulso, amordaçado pela nossa própria inteligência (ou estupidez).
Hoje sei que Ele existe porque acontece-me muitas vezes sentir duramente, quase fisicamente, a sua falta em mim. Nessas ocasiões, como agora mesmo, é bom invocá-lo, pedir-lhe para que volte a fazer-se sentir:
Vem, Espírito Santo,
pois sem Ti, Deus está longe,
Jesus ressuscitado perde-se no passado,
o Evangelho parece letra morta,
a Igreja uma simples organização,
a autoridade, um mero exercício de poder,
a missão, uma propaganda,
o agir moral, um agir de servos.
Contigo, no entanto, ó Espírito Santo,
o Cosmos revive,
o Ressucitado faz-se presença,
Deus está perto,
o Evangelho é fonte de vida,
a Igreja torna-se comunhão,
a autoridade é um serviço,
a liturgia torna-se viva e pentrante,
e o agir humano, ético e moral,
é um caminho para a liberdade
(Cardeal Martini)
Hoje sei que Ele existe porque acontece-me muitas vezes sentir duramente, quase fisicamente, a sua falta em mim. Nessas ocasiões, como agora mesmo, é bom invocá-lo, pedir-lhe para que volte a fazer-se sentir:
Vem, Espírito Santo,
pois sem Ti, Deus está longe,
Jesus ressuscitado perde-se no passado,
o Evangelho parece letra morta,
a Igreja uma simples organização,
a autoridade, um mero exercício de poder,
a missão, uma propaganda,
o agir moral, um agir de servos.
Contigo, no entanto, ó Espírito Santo,
o Cosmos revive,
o Ressucitado faz-se presença,
Deus está perto,
o Evangelho é fonte de vida,
a Igreja torna-se comunhão,
a autoridade é um serviço,
a liturgia torna-se viva e pentrante,
e o agir humano, ético e moral,
é um caminho para a liberdade
(Cardeal Martini)
terça-feira, março 30, 2004
Povo eleito ou povo feito?
Não são frequentes as ocasiões em que somos confrontados com as nossas próprias palavras e levados a repensar o sentido profundo, se calhar até a causa primeira daquilo que acabámos de dizer. O "quase português" Lutz conseguiu hoje isso comigo a propósito do meu último post. Particularmente a sua frase: "Não penso que o Guia dos Perplexos está a justificar o sofrimento passado do povo judeu, ou o actual ou um sofrimento futuro... Mas está a dar-lhe sentido - e isto é uma espada de dois gumes!" , ficou a martelar-me a consciência. Fiquei a pensar se estaria eu a atribuír ao povo judeu um papel, quase cósmico, que me convirá a mim enquanto parte da humanidade, mas que não convirá forçosamente aos próprios judeus.
Todavia pensando bem, e contrariamentente ao que diz Lutz, embora, como já disse, eu não tenha ideias muito claras sobre o significado teológico universal do carácter de povo eleito dos judeus, definitivamente eu não penso que o povo judeu tenha sido eleito para sofrer . Aliás, parece-me redutor que a história do povo judeu seja considerada apenas como uma história de sofrimento. Na minha modesta opinião, é antes uma história de triunfo, sobre o sofrimento, sobre as perseguições, sobre si próprios.
Pois o facto é que, mais do que qualquer outro povo, mesmo sem país próprio, mesmo dispersos pelo mundo inteiro, eles conseguiram manter na íntegra a sua forte identidade cultural e ética enquanto povo. E isto há mais de 3.000 anos. Não conheço outro caso assim. Admiro-os imensamente por isso.
As questões que tenho colocado sobre o estado de Israel não se devem à minha vontade de os ver continuar a desempenhar o seu papel de "judeus errantes". Devem-se sim a uma genuína preocupação sobre a preservação do seu património ético que tanta falta faz à humanidade e que tão maltratado tem sido ultimamente pelos zelotas de hoje.
Mas o meu amigo Nuno das duas ruas da Judiaria terá certamente algo a dizer sobre isto. Embora neste momento tenha algo muito melhor com que se ocupar. E pelo qual lhe vou já enviando os parabéns antecipados.
Todavia pensando bem, e contrariamentente ao que diz Lutz, embora, como já disse, eu não tenha ideias muito claras sobre o significado teológico universal do carácter de povo eleito dos judeus, definitivamente eu não penso que o povo judeu tenha sido eleito para sofrer . Aliás, parece-me redutor que a história do povo judeu seja considerada apenas como uma história de sofrimento. Na minha modesta opinião, é antes uma história de triunfo, sobre o sofrimento, sobre as perseguições, sobre si próprios.
Pois o facto é que, mais do que qualquer outro povo, mesmo sem país próprio, mesmo dispersos pelo mundo inteiro, eles conseguiram manter na íntegra a sua forte identidade cultural e ética enquanto povo. E isto há mais de 3.000 anos. Não conheço outro caso assim. Admiro-os imensamente por isso.
As questões que tenho colocado sobre o estado de Israel não se devem à minha vontade de os ver continuar a desempenhar o seu papel de "judeus errantes". Devem-se sim a uma genuína preocupação sobre a preservação do seu património ético que tanta falta faz à humanidade e que tão maltratado tem sido ultimamente pelos zelotas de hoje.
Mas o meu amigo Nuno das duas ruas da Judiaria terá certamente algo a dizer sobre isto. Embora neste momento tenha algo muito melhor com que se ocupar. E pelo qual lhe vou já enviando os parabéns antecipados.
sexta-feira, março 26, 2004
Translation found
“Num lugar sem humanidade, aspira a ser humano.” Está então encontrada a expressão mais perfeita em português desta magnífica frase do sábio rabi Hillel. Como o Nuno referiu ela faz parte do Pirke Avot, um dos livros da Mishnah. Os judeus acreditam que os ensinamentos deste livro não são meros aforismos mas que no seu todo revelam as convicções que moldam a visão judaica do mundo e da humanidade. Estudam este livro porque exijem a si próprios, como discípulos da Torah, um elevado grau de ética e responsabilidade social (citações parciais de S.Butterfass). Encontram-se lá muitas outras frases extraordinárias, mesmo dum ponto de vista cristão como o meu. Alguns exemplos (tradução minha do inglês): “Não é o estudo da Lei de Deus que é essencial, mas sim a sua prática”, “Ama trabalhar, odeia dominar e evita intimidade com o poder”, “Qual o caminho a escolher? Aquele que é honroso e merece a honra de toda a humanidade”, “Não julgues o outro sem ter estado na sua posição”, “Quanto mais Torah, mais vida; quanto mais estudo, mais sabedoria; quanto mais aconselhamento, maior compreensão; quanto mais caridade, mais paz.”,”Quem é sábio? Aquele que aprende com toda a gente. Quem é poderoso? Aquele que controla a sua paixão. Quem é rico? Aquele que se satisfaz com a sua porção. Quem é honrado? Aquele que sabe honrar os outros.” etc., etc.
Permito-me citar tudo isto porque o meu amigo Nuno me fez “judeu honorário”. E isso é algo que, pelo facto de vir do judeu Nuno Guerreiro, me honra verdadeiramente muito. Sobretudo porque o Nuno conhece bem as minhas preocupações e reservas quanto a certos aspectos do papel que a comunidade do povo judaico está a desempenhar no mundo de hoje, sobretudo em Israel, terra que lhes foi prometida e que hoje lhes pertence.
Eu explico melhor. No incipiente edifício da minha Fé e teologia cristãs, na minha visão do mundo e da sua transcendência, o povo judeu tem um papel muito importante que não sei ainda explicar bem mas que está nos antípodas da noção de povo deícida, como muitos acreditaram e ainda alguns acreditam. Não, apesar de Jesus nos ter trazido a Nova Aliança com Deus, uma aliança nova porque universal, para todos os homens, para novos tempos históricos, eu acredito profundamente que o papel de povo escolhido para os judeus continuou a ter um sentido, desejado por Deus mas que não sei discernir claramente.
O facto de terem sido os judeus os “descobridores” do monoteísmo ético trouxe-lhes um carácter único, diferente de qualquer outro povo. Não quero alongar-me muito mas sinto há muito que a natureza e história do povo judaico, particularmente nos momentos mais difíceis, a sua capacidade de autopreservação, não só da sua existência como povo mas sobretudo do seu património ético, é algo que para mim tem uma significação transcendente qualquer.
É precisamente por isso que me dói ver aquilo em que se tornou hoje o estado de Israel, ver o que fazem aqueles que o governam. Penso naquelas frases do Pirke Avot que transcrevi acima e não entendo como é possível acontecer o que lá acontece. Sobretudo, porque acontece cada vez mais à medida que a sociedade israelita vai ficando menos secular e mais dominada pelos partidos religiosos.
Olhando o que acontece hoje e olhando também para trás, para o que aconteceu também no primeiro milénio AC, em terras de Israel, pergunto a mim próprio (e já perguntei isso ao Nuno) se o judaísmo na sua essência será compatível com a posse de Israel. Será que o esforço de a manter não preverte a natureza ética do judaísmo? O facto é que lendo Jeremias, Ezequiel, Isaías, Reis, Juízes, isso parecia ser assim já nessa altura. Olho para Sharon e lembro-me de Saúl. Comparando o judaísmo da Diáspora com o judaísmo de Sião, eu prefiro infinitamente o primeiro. Será que o pathos do povo judeu é procurar a Terra Prometida, mas não possuí-la?
Sei bem que uma das razões da génese do sionismo foi a necessidade real e legítima de criar para o povo judeu um país, um estado que o possa proteger num mundo hostil e ciclicamente persecutório. Mas pergunto-me: neste estado judeu que é Israel quem protege o povo judeu de si próprio?
Com estas reflexões, já demasiado longas, não pretendo ofender nem perturbar ninguém, mas agora que sou “judeu honorário” tenho absolutamente que fazer estas perguntas. E “quando um judeu faz uma pergunta recebe sempre uma resposta”.
Agora acabo. Tenho uma pequena cirurgia para fazer...
Permito-me citar tudo isto porque o meu amigo Nuno me fez “judeu honorário”. E isso é algo que, pelo facto de vir do judeu Nuno Guerreiro, me honra verdadeiramente muito. Sobretudo porque o Nuno conhece bem as minhas preocupações e reservas quanto a certos aspectos do papel que a comunidade do povo judaico está a desempenhar no mundo de hoje, sobretudo em Israel, terra que lhes foi prometida e que hoje lhes pertence.
Eu explico melhor. No incipiente edifício da minha Fé e teologia cristãs, na minha visão do mundo e da sua transcendência, o povo judeu tem um papel muito importante que não sei ainda explicar bem mas que está nos antípodas da noção de povo deícida, como muitos acreditaram e ainda alguns acreditam. Não, apesar de Jesus nos ter trazido a Nova Aliança com Deus, uma aliança nova porque universal, para todos os homens, para novos tempos históricos, eu acredito profundamente que o papel de povo escolhido para os judeus continuou a ter um sentido, desejado por Deus mas que não sei discernir claramente.
O facto de terem sido os judeus os “descobridores” do monoteísmo ético trouxe-lhes um carácter único, diferente de qualquer outro povo. Não quero alongar-me muito mas sinto há muito que a natureza e história do povo judaico, particularmente nos momentos mais difíceis, a sua capacidade de autopreservação, não só da sua existência como povo mas sobretudo do seu património ético, é algo que para mim tem uma significação transcendente qualquer.
É precisamente por isso que me dói ver aquilo em que se tornou hoje o estado de Israel, ver o que fazem aqueles que o governam. Penso naquelas frases do Pirke Avot que transcrevi acima e não entendo como é possível acontecer o que lá acontece. Sobretudo, porque acontece cada vez mais à medida que a sociedade israelita vai ficando menos secular e mais dominada pelos partidos religiosos.
Olhando o que acontece hoje e olhando também para trás, para o que aconteceu também no primeiro milénio AC, em terras de Israel, pergunto a mim próprio (e já perguntei isso ao Nuno) se o judaísmo na sua essência será compatível com a posse de Israel. Será que o esforço de a manter não preverte a natureza ética do judaísmo? O facto é que lendo Jeremias, Ezequiel, Isaías, Reis, Juízes, isso parecia ser assim já nessa altura. Olho para Sharon e lembro-me de Saúl. Comparando o judaísmo da Diáspora com o judaísmo de Sião, eu prefiro infinitamente o primeiro. Será que o pathos do povo judeu é procurar a Terra Prometida, mas não possuí-la?
Sei bem que uma das razões da génese do sionismo foi a necessidade real e legítima de criar para o povo judeu um país, um estado que o possa proteger num mundo hostil e ciclicamente persecutório. Mas pergunto-me: neste estado judeu que é Israel quem protege o povo judeu de si próprio?
Com estas reflexões, já demasiado longas, não pretendo ofender nem perturbar ninguém, mas agora que sou “judeu honorário” tenho absolutamente que fazer estas perguntas. E “quando um judeu faz uma pergunta recebe sempre uma resposta”.
Agora acabo. Tenho uma pequena cirurgia para fazer...
quinta-feira, março 25, 2004
Lost in translation
Nuno, amigo e irmão, a tradução da frase do Rabi Hillel que hoje postaste não será antes esta: num lugar onde ninguém se comporta como ser humano, aí tu tens mesmo que ser humano?
Foi aqui que fui ver e lá dizia: "In a place where no one behaves like a human being, you must strive to be human". Posso estar enganado mas é que assim me parece mais claro e também mais apropriado face aos últimos acontecimentos.
Um abraço aí para os States.
Foi aqui que fui ver e lá dizia: "In a place where no one behaves like a human being, you must strive to be human". Posso estar enganado mas é que assim me parece mais claro e também mais apropriado face aos últimos acontecimentos.
Um abraço aí para os States.
Novos e bons links
Gente que tembém ama a mais prodigiosa cidade do universo.
Las Vegas tem um cooler. O Céu também.
I only represent myself.
A ilustre casa de Salina.
Las Vegas tem um cooler. O Céu também.
I only represent myself.
A ilustre casa de Salina.
quarta-feira, março 24, 2004
Heart attack and vine
O Francisco José Viegas, será talvez a pessoa da blogosfera que eu mais respeito. Respeito não exprime bem. O Francisco José Viegas, será talvez a pessoa da blogosfera de quem eu mais gosto. Gosto da sua polidez, da sua sabedoria livre de qualquer jactância, do esforço de honestidade intelectual que tenta imprimir ao que escreve, mesmo naquelas polémicas mais agrestes. O Aviz é um blogue que leio várias vezes ao dia, sempre com prazer e proveito, mesmo quando discordo do Francisco. Não o conheço pessoalmente mas imagino que deve ser daquelas pessoas com quem é impossível zangar-se. Como dizem os franceses: "un brave homme".
Há temas a que ele se tem dedicado e nos quais partilho inteiramente as suas opiniões: a esterilidade do debate que se faz em Portugal, seja qual for o assunto, a alimentação dos egos como razão primeira para projectar a opinião própria, o patrulhamento ideológico. Tudo isso existe e tudo isso é triste. E o Francisco tem sido um exemplo do contrário de todo esse fado.
Ora bem, ontem o Público anunciava que o filme Paixão de Cristo já foi visto por mais de 250.000 espectadores portugueses ao fim de 10 dias de exibição e que já facturou cerca de 300 milhões de dólares nas bilheteiras dos EUA, sendo já um dos maiores "blockbusters" de sempre apesar de ou por causa de toda a polémica que precedeu a estreia. Equivale mais ou menos a 60 milhões de bilhetes vendidos!
Ontem também, no Aviz podíamos ler outro dado importante: um pastor brasileiro morreu de ataque cardíaco durante o visionamento do filme sendo já a segunda pessoa a quem isso aconteceu após um primeiro e infausto acontecimento num cinema de Wichita, Kansas.
Fiquei a pensar: será isto um exemplo daquela elocubração adversativa que o Francisco tão bem identificou nalguns polemistas da nossa praça?
Isto não é uma crítica, é mais um lamento sobre as consequências do ambiente do debate entre nós. Sobretudo se fôr naqueles que mais admiramos.
PS: Devo confessar que ainda não vi o filme. Mas vou ver. Antes porém vou fazer uma prova de esforço.
Há temas a que ele se tem dedicado e nos quais partilho inteiramente as suas opiniões: a esterilidade do debate que se faz em Portugal, seja qual for o assunto, a alimentação dos egos como razão primeira para projectar a opinião própria, o patrulhamento ideológico. Tudo isso existe e tudo isso é triste. E o Francisco tem sido um exemplo do contrário de todo esse fado.
Ora bem, ontem o Público anunciava que o filme Paixão de Cristo já foi visto por mais de 250.000 espectadores portugueses ao fim de 10 dias de exibição e que já facturou cerca de 300 milhões de dólares nas bilheteiras dos EUA, sendo já um dos maiores "blockbusters" de sempre apesar de ou por causa de toda a polémica que precedeu a estreia. Equivale mais ou menos a 60 milhões de bilhetes vendidos!
Ontem também, no Aviz podíamos ler outro dado importante: um pastor brasileiro morreu de ataque cardíaco durante o visionamento do filme sendo já a segunda pessoa a quem isso aconteceu após um primeiro e infausto acontecimento num cinema de Wichita, Kansas.
Fiquei a pensar: será isto um exemplo daquela elocubração adversativa que o Francisco tão bem identificou nalguns polemistas da nossa praça?
Isto não é uma crítica, é mais um lamento sobre as consequências do ambiente do debate entre nós. Sobretudo se fôr naqueles que mais admiramos.
PS: Devo confessar que ainda não vi o filme. Mas vou ver. Antes porém vou fazer uma prova de esforço.
terça-feira, março 23, 2004
O eu errante
Durante os dias eu erro.
Erro por entre os corredores
e a actividade dum armazém,
distraindo a minha angústia.
Erro sempre que decido
sem acreditar.
Erro quando procuro
aquilo que pode ser encontrado
mas não procurado.
Erro em busca de paz.
Erro quando penso tê-la encontrado.
Erro em redor duma saída.
Erro porque é apenas uma recaída.
Erro como aquele judeu
que até ao fim, até à cruz,
negou o Cristo crucificado
e que, por ter errado,
foi condenado
a ser errante,
para sempre.
E novamente rezo, como os de Missnanga:
Meu Deus e meu Pai,
Livra-nos do medo,
livra-nos da frustração,
deixa-nos chegar ao nosso destino.
Erro por entre os corredores
e a actividade dum armazém,
distraindo a minha angústia.
Erro sempre que decido
sem acreditar.
Erro quando procuro
aquilo que pode ser encontrado
mas não procurado.
Erro em busca de paz.
Erro quando penso tê-la encontrado.
Erro em redor duma saída.
Erro porque é apenas uma recaída.
Erro como aquele judeu
que até ao fim, até à cruz,
negou o Cristo crucificado
e que, por ter errado,
foi condenado
a ser errante,
para sempre.
E novamente rezo, como os de Missnanga:
Meu Deus e meu Pai,
Livra-nos do medo,
livra-nos da frustração,
deixa-nos chegar ao nosso destino.
segunda-feira, março 22, 2004
Voltar para casa (2)
Ó Senhor,
Tu não me deixaste partir para longe de Ti.
Se por vezes me aconteceu esquecer-Te,
Tu meu Deus, Tu sempre me suportaste e socorreste.
Quando o meu corpo e a minha alma não podiam aguentar mais,
gritei por Ti do fundo do abismo.
Imediatamente acorreste e me estendeste a mão,
arrancando-me ao pântano da minha miséria
e restituindo-me a alegria da Tua salvação.
Eis, Senhor, o que eu fui, eis o que eu sou.
Hoje volto inteiramente para ti!
Vêde a figura que fiz diante de ti, Senhor!
Face a face com o Teu rosto,
ela chama-se miséria, ó soberana misericórdia!
Não Te escondo nada destes cantos e recantos mais secretos da minha vida,
Tu o sabes, ó divina Verdade.
E peço-Te, que tudo em mim seja claridade na Tua presença.
Porque eu não receio a ninguém como a mim mesmo.
Tenho tanto medo de me deixar enganar,
sem que o saiba ou mesmo conscientemente.
Mas é em Ti que eu creio, Senhor, és Tu quem eu espero.
Dá-Te a mim, porque eu não procuro mais ninguém.
Tem piedade de mim, Senhor, ergue-Te, vem ao meu encontro e vê!
Quero permanecer firme na Tua fé, e quero crescer na esperança.
E, quanto ao Teu amor, eu me agarro a ele
como um pobre e um mendigo diante de Ti
(oração de Guilherme de Saint-Thierry)
Tu não me deixaste partir para longe de Ti.
Se por vezes me aconteceu esquecer-Te,
Tu meu Deus, Tu sempre me suportaste e socorreste.
Quando o meu corpo e a minha alma não podiam aguentar mais,
gritei por Ti do fundo do abismo.
Imediatamente acorreste e me estendeste a mão,
arrancando-me ao pântano da minha miséria
e restituindo-me a alegria da Tua salvação.
Eis, Senhor, o que eu fui, eis o que eu sou.
Hoje volto inteiramente para ti!
Vêde a figura que fiz diante de ti, Senhor!
Face a face com o Teu rosto,
ela chama-se miséria, ó soberana misericórdia!
Não Te escondo nada destes cantos e recantos mais secretos da minha vida,
Tu o sabes, ó divina Verdade.
E peço-Te, que tudo em mim seja claridade na Tua presença.
Porque eu não receio a ninguém como a mim mesmo.
Tenho tanto medo de me deixar enganar,
sem que o saiba ou mesmo conscientemente.
Mas é em Ti que eu creio, Senhor, és Tu quem eu espero.
Dá-Te a mim, porque eu não procuro mais ninguém.
Tem piedade de mim, Senhor, ergue-Te, vem ao meu encontro e vê!
Quero permanecer firme na Tua fé, e quero crescer na esperança.
E, quanto ao Teu amor, eu me agarro a ele
como um pobre e um mendigo diante de Ti
(oração de Guilherme de Saint-Thierry)
Voltar para casa (1)
Ontem, 4ºdomingo da Quaresma, voltei a ouvir na missa a parábola do filho pródigo (S. Lucas 15, 11-32):
Um homem tinha dois filhos. O mais novo disse ao pai: 'Pai, dá-me a parte dos bens que me corresponde.' E o pai repartiu os bens entre os dois. Poucos dias depois, o filho mais novo, juntando tudo, partiu para uma terra longínqua e por lá esbanjou tudo quanto possuía, numa vida desregrada. Depois de gastar tudo, houve grande fome nesse país e ele começou a passar privações. Então, foi colocar-se ao serviço de um dos habitantes daquela terra, o qual o mandou para os seus campos guardar porcos. Bem desejava ele encher o estômago com as alfarrobas que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava. E, caindo em si, disse: 'Quantos jornaleiros de meu pai têm pão em abundância, e eu aqui a morrer de fome! Levantar-me-ei, irei ter com meu pai e vou dizer-lhe: Pai, pequei contra o Céu e contra ti; já não sou digno de ser chamado teu filho; trata-me como um dos teus jornaleiros.' E, levantando-se, foi ter com o pai. Quando ainda estava longe, o pai viu-o e, enchendo-se de compaixão, correu a lançar-se-lhe ao pescoço e cobriu-o de beijos. O filho disse-lhe: 'Pai, pequei contra o Céu e contra ti; já não mereço ser chamado teu filho.' Mas o pai disse aos seus servos: 'Trazei depressa a melhor túnica e vesti-lha; dai-lhe um anel para o dedo e sandálias para os pés. Trazei o vitelo gordo e matai-o; vamos fazer um banquete e alegrar-nos, porque este meu filho estava morto e reviveu, estava perdido e foi encontrado.' E a festa principiou. Ora, o filho mais velho estava no campo. Quando regressou, ao aproximar-se de casa ouviu a música e as danças. Chamou um dos servos e perguntou-lhe o que era aquilo. Disse-lhe ele: 'O teu irmão voltou e o teu pai matou o vitelo gordo, porque chegou são e salvo.' Encolerizado, não queria entrar; mas o seu pai, saindo, suplicava-lhe que entrasse. Respondendo ao pai, disse-lhe: 'Há já tantos anos que te sirvo sem nunca transgredir uma ordem tua, e nunca me deste um cabrito para fazer uma festa com os meus amigos; e agora, ao chegar esse teu filho, que gastou os teus bens com meretrizes, mataste-lhe o vitelo gordo.' O pai respondeu-lhe: 'Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu. Mas tínhamos de fazer uma festa e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e reviveu; estava perdido e foi encontrado'.
Já aqui aqui escrevi que foi esta parábola que, já no início da minha vida adulta, me trouxe de novo à Fé. Ontem, ao escutá-la de novo e ao escutar a sábia homilia do padre, comprendi de novo a imensidade da reconciliação que Deus nos oferece. A reconciliação entre os homens permite-nos quando muito voltar à situação primordial, antes do conflito e separação. A nossa reconciliação com Deus permite algo infinitamente maior: permite-nos nascer de novo, permite-nos iniciar uma nova vida e simplesmente porque entendemos enfim a infinitude do amor de Deus por nós todos.
Cristo, Filho de Deus, foi o intermediário da reconciliação entre nós e Deus. A sua morte às nossas mãos é aquilo que nos faz caír em nós e ver o decaímento da nossa condição humana. A sua ressurreição é também a nossa ressurreição enquanto filhos amados e sempre perdoado por Deus.
É extraordinário pensar que o Pai sai de casa para ir buscar para junto de si tanto o filho pródigo, que contra ele pecou, como o filho mais velho, que sempre esteve junto do Pai e que por isso se julga mais digno do Seu amor. Ninguém se pode julgar mais merecedor do amor de Deus, mas até esse pecado de soberba Deus nosso Pai perdoa. Nunca como aqui, nesta história tão simples, Cristo explicou tão bem a nossa relação com Deus. Verdadeiramente somos Seus filhos.
É curioso que se há quase 20 anos, ao escutar esta parábola, eu me senti interpelado como se fosse o filho pródigo, ontem senti-me chamado como sendo o filho mais velho. De ambas as vezes perdoado. De ambas as vezes simplesmente Seu filho.
Um homem tinha dois filhos. O mais novo disse ao pai: 'Pai, dá-me a parte dos bens que me corresponde.' E o pai repartiu os bens entre os dois. Poucos dias depois, o filho mais novo, juntando tudo, partiu para uma terra longínqua e por lá esbanjou tudo quanto possuía, numa vida desregrada. Depois de gastar tudo, houve grande fome nesse país e ele começou a passar privações. Então, foi colocar-se ao serviço de um dos habitantes daquela terra, o qual o mandou para os seus campos guardar porcos. Bem desejava ele encher o estômago com as alfarrobas que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava. E, caindo em si, disse: 'Quantos jornaleiros de meu pai têm pão em abundância, e eu aqui a morrer de fome! Levantar-me-ei, irei ter com meu pai e vou dizer-lhe: Pai, pequei contra o Céu e contra ti; já não sou digno de ser chamado teu filho; trata-me como um dos teus jornaleiros.' E, levantando-se, foi ter com o pai. Quando ainda estava longe, o pai viu-o e, enchendo-se de compaixão, correu a lançar-se-lhe ao pescoço e cobriu-o de beijos. O filho disse-lhe: 'Pai, pequei contra o Céu e contra ti; já não mereço ser chamado teu filho.' Mas o pai disse aos seus servos: 'Trazei depressa a melhor túnica e vesti-lha; dai-lhe um anel para o dedo e sandálias para os pés. Trazei o vitelo gordo e matai-o; vamos fazer um banquete e alegrar-nos, porque este meu filho estava morto e reviveu, estava perdido e foi encontrado.' E a festa principiou. Ora, o filho mais velho estava no campo. Quando regressou, ao aproximar-se de casa ouviu a música e as danças. Chamou um dos servos e perguntou-lhe o que era aquilo. Disse-lhe ele: 'O teu irmão voltou e o teu pai matou o vitelo gordo, porque chegou são e salvo.' Encolerizado, não queria entrar; mas o seu pai, saindo, suplicava-lhe que entrasse. Respondendo ao pai, disse-lhe: 'Há já tantos anos que te sirvo sem nunca transgredir uma ordem tua, e nunca me deste um cabrito para fazer uma festa com os meus amigos; e agora, ao chegar esse teu filho, que gastou os teus bens com meretrizes, mataste-lhe o vitelo gordo.' O pai respondeu-lhe: 'Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu. Mas tínhamos de fazer uma festa e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e reviveu; estava perdido e foi encontrado'.
Já aqui aqui escrevi que foi esta parábola que, já no início da minha vida adulta, me trouxe de novo à Fé. Ontem, ao escutá-la de novo e ao escutar a sábia homilia do padre, comprendi de novo a imensidade da reconciliação que Deus nos oferece. A reconciliação entre os homens permite-nos quando muito voltar à situação primordial, antes do conflito e separação. A nossa reconciliação com Deus permite algo infinitamente maior: permite-nos nascer de novo, permite-nos iniciar uma nova vida e simplesmente porque entendemos enfim a infinitude do amor de Deus por nós todos.
Cristo, Filho de Deus, foi o intermediário da reconciliação entre nós e Deus. A sua morte às nossas mãos é aquilo que nos faz caír em nós e ver o decaímento da nossa condição humana. A sua ressurreição é também a nossa ressurreição enquanto filhos amados e sempre perdoado por Deus.
É extraordinário pensar que o Pai sai de casa para ir buscar para junto de si tanto o filho pródigo, que contra ele pecou, como o filho mais velho, que sempre esteve junto do Pai e que por isso se julga mais digno do Seu amor. Ninguém se pode julgar mais merecedor do amor de Deus, mas até esse pecado de soberba Deus nosso Pai perdoa. Nunca como aqui, nesta história tão simples, Cristo explicou tão bem a nossa relação com Deus. Verdadeiramente somos Seus filhos.
É curioso que se há quase 20 anos, ao escutar esta parábola, eu me senti interpelado como se fosse o filho pródigo, ontem senti-me chamado como sendo o filho mais velho. De ambas as vezes perdoado. De ambas as vezes simplesmente Seu filho.
sexta-feira, março 19, 2004
Terrorismo é guerra, basta ya!
Valores, quais valores? Foi isso que me perguntaram após o último post. Perguntam-me também se a guerra se justifica para defender esses valores. No fundo são duas perguntas: como sei eu que os nossos valores são absolutos? mesmo que o sejam valem uma guerra?
Deixem-me ir do particular para o geral. Esta guerra de que falamos, a do Iraque, é para mim a mais estúpida e iníqua de que tenho memória. É estúpida porque ataca onde não devia, é estúpida porque não pode ser mais contraproducente. É iníqua porque, a pretexto de valores, dos nossos valores, parece desmenti-los.
Mas esta guerra foi uma resposta, estúpida, ineficaz e iníqua, a uma outra guerra, surda, tenaz, metódica, cirúrgica, uma guerra sem quartel feita contra nós e os valores que criámos ao longo de séculos. Valores pelos quais devemos lutar pois, não sendo absolutos, não sendo por nós plenamente vividos, não se conhecem outros melhores. É contra essa guerra que não podemos negar-nos, não podemos enterrar a cabeça na areia, desistir. Essa tentação que por aí pressinto parece-me um sinal de renúncia, um desejo de olvido, um antegosto de morte. A paz que se apregoa por aí poderá vir a ser a paz dos mortos, do obscurantismo.
É certo que os primeiros actos que se quiseram fazer, em nosso nome, foram (não é demais insistir) inacreditavelmente estúpidos e iníquos, mas não estou certo que estejamos pior do que antes. Acredito sim que as coisas estão agora muito mais claras. Tão claras que é difícil olhar para elas, vê-las como realmente são. Mas, mais do que nunca, é necessário olhar nos olhos o outro lado. Discernir onde verdadeiramente estão as forças que nos querem destruir. Apoiar as forças que connosco aceitam viver. Aceitar que temos de melhorar, mas não temos que ser destruídos, anulados.
Para mim, o que devemos gritar, depois de Madrid, é ligeiramente diferente do que se diz por aí: Terrorismo é guerra, basta ya!.
Deixem-me ir do particular para o geral. Esta guerra de que falamos, a do Iraque, é para mim a mais estúpida e iníqua de que tenho memória. É estúpida porque ataca onde não devia, é estúpida porque não pode ser mais contraproducente. É iníqua porque, a pretexto de valores, dos nossos valores, parece desmenti-los.
Mas esta guerra foi uma resposta, estúpida, ineficaz e iníqua, a uma outra guerra, surda, tenaz, metódica, cirúrgica, uma guerra sem quartel feita contra nós e os valores que criámos ao longo de séculos. Valores pelos quais devemos lutar pois, não sendo absolutos, não sendo por nós plenamente vividos, não se conhecem outros melhores. É contra essa guerra que não podemos negar-nos, não podemos enterrar a cabeça na areia, desistir. Essa tentação que por aí pressinto parece-me um sinal de renúncia, um desejo de olvido, um antegosto de morte. A paz que se apregoa por aí poderá vir a ser a paz dos mortos, do obscurantismo.
É certo que os primeiros actos que se quiseram fazer, em nosso nome, foram (não é demais insistir) inacreditavelmente estúpidos e iníquos, mas não estou certo que estejamos pior do que antes. Acredito sim que as coisas estão agora muito mais claras. Tão claras que é difícil olhar para elas, vê-las como realmente são. Mas, mais do que nunca, é necessário olhar nos olhos o outro lado. Discernir onde verdadeiramente estão as forças que nos querem destruir. Apoiar as forças que connosco aceitam viver. Aceitar que temos de melhorar, mas não temos que ser destruídos, anulados.
Para mim, o que devemos gritar, depois de Madrid, é ligeiramente diferente do que se diz por aí: Terrorismo é guerra, basta ya!.
quinta-feira, março 18, 2004
Crash
Dizes bem, meu caro CC, o amor ao ódio, à morte, não é exclusivo dos outros. Existiu entre nós, e continua a existir, pronto a despontar à primeira oportunidade. Mas temos que nos dar a nós próprios o crédito de termos aprendido que esse ódio, esse desejo de morte, não é digno da nossa condição humana. Dois milénios de cristianismo, cinco séculos de humanismo, dois séculos de democracia, até século e meio de socialismo, acabaram por nos ensinar a nós, os deste lado, que a vida, a tolerância, o bem comum, o respeito pelo indivíduo são valores fundamentais. É certo que houve e haverão recaídas, é certo que o individualismo redundou em egoísmo. Mas, caramba, não menosprezemos os nossos valores, não entreguemos os nossos ombros para arcar com todas as culpas do mundo. Não desculpemos aos outros aquilo que não perdoamos a nós próprios. O que Cristo nos ensinou foi que não devemos ver o argueiro no olho do outro em vez da trave que está no nosso. Não disse para ignorarmos a trave quando ela está no olho do outro. Temos de ser justos e rectos mas não apenas connosco próprios. A nossa (má) consciência de seres morais não deve obliterar a visão da realidade à nossa volta.
E essa realidade é que há quem nos queira destruir não pelo que lhes fizemos ou fazemos mas simplesmente pelo que somos. Há quem nos queira destruír apenas porque aqueles valores que tanto prezas e pelos quais tantos deram a vida, esses valores lhes são intoleráveis. Podemos não ser grande coisa mas não nos deixemos levar assim para o altar do sacrifício. Sobretudo porque desse sacrifício, diferentemente do Outro, não sairá redenção para ninguém.
O Cordeiro de Deus foi sacrificado por nós porque assim Ele o quis e para que nós assim O víssemos. Não foi comido por lobos ferozes numa vereda escura.
Se o Unamuno, que me deste a conhecer, estivesse aqui hoje connosco, estaria aos berros a gritar aos Bin Ladens deste mundo: no venceraos y no convenceraos!
E essa realidade é que há quem nos queira destruir não pelo que lhes fizemos ou fazemos mas simplesmente pelo que somos. Há quem nos queira destruír apenas porque aqueles valores que tanto prezas e pelos quais tantos deram a vida, esses valores lhes são intoleráveis. Podemos não ser grande coisa mas não nos deixemos levar assim para o altar do sacrifício. Sobretudo porque desse sacrifício, diferentemente do Outro, não sairá redenção para ninguém.
O Cordeiro de Deus foi sacrificado por nós porque assim Ele o quis e para que nós assim O víssemos. Não foi comido por lobos ferozes numa vereda escura.
Se o Unamuno, que me deste a conhecer, estivesse aqui hoje connosco, estaria aos berros a gritar aos Bin Ladens deste mundo: no venceraos y no convenceraos!
terça-feira, março 16, 2004
Desta vez, nos idos de Março:
Um poeta, um jornalista, um estudante, um advogado, um engenheiro. Nos vintes, nos trintas e quase nos quarentas. E outros que não se sabe ainda. De ex-seminaristas a ex-ateus. Unidade e diversidade. Uma semente de amizade. Um desejo de verdade. Uma vontade de testemunho. Figueiras que querem dar fruto.
segunda-feira, março 15, 2004
O diálogo inter-religioso não é possível
com quem nos diz: vocês amam a vida e nós amamos a morte. Deve ser aqui que se passa ao choque de civilizações.
"As notícias da minha morte são um pouco exageradas"
Comecei pois por citar Churchill, esse grande teimoso. Faço isto porque verifiquei que o meu último post de 6ªfeira deu a vários leitores e bloggers amigos a percepção de que eu me preparava para interromper o Guia. O meu "brüder" David Bengelsdorff fez a propósito uma sábia reflexão, citando Eclesiastes, sobre qual será a esperança média de vida de um blogue. Por seu turno o meu irmão lá do Norte, o Fernando Macedo fez-me dois posts que são o mais belo incitamento a continuar que se pode ter. Aliás, Fernando, como os meus filhos são meio-sangue tripeiros, é com muito frequência que vou ao Porto e, particularmente ao magnífico Parque da Cidade. Passarei a estar muito atento aos ciclistas que por lá circulam, sobretudo àqueles que apregoam Cristo pedalando...
Também recebi vários mails, alguns belíssimos, alguns trazendo-me notícias de pessoas que julgava já extraviadas. A todos eles, Maria, Marcus, Pedro, Rui, etc., a todos eles agradeço a preocupação e cuidado.
Mas queria dizer a todos estes meus amigos que, inadvertidamente, foram por mim induzidos em erro do qual peço desculpa e passo a explicar.
Começaria por dizer que o Guia tem sido uma benção para mim, particularmente num período difícil da minha vida. Já aqui expliquei porquê e mantenho tudo o que disse. O que acontece é que, como já repararam, o conteúdo do Guia é e pretende ser um só: a reflexão sobre a minha Fé. Logo à partida decidi que não iria falar aqui de política, de guerras, do Benfica, de cinema, do meu dia a dia, enfim de muitas coisas que são importantes para mim, mas que decidi não precisar de blogues para falar delas. E tenho-me mantido razoavelmente coerente com isso. Como tal e como diz um amigo blogger, este Guia é assumidamente confessional e não mais do que isso. E assim continuará. E é aqui que a dificuldade surge.
A questão que coloquei na 6ª feira passada tem precisamente a ver com isto. É certo que a minha Fé é razoavelmente forte e tem-se fortalecido através do Guia. Mas é igualmente certo que os meus recursos teológicos são limitados. Não sou padre nem seminarista nem estudante de Teologia. Só tenho a catequese da 1ª comunhão, nem crismado sou.
Já li uma pequena parteda Bíblia, já li bastantes livros sobre o Cristianismo, um pouco de história das religiões, um pouco sobre outras religiões, mas a minha disponibilidade de tempo e de espírito para ler é (cada vez mais) limitada.
Não é pois um problema de falta de fé nem de ânimo (o qual contudo melhorou bastante este fim de semana pelas mensagens recebidas): é, prosaicamente, um problema de falta de matéria-prima. Na 6ªfeira senti, como já senti noutras alturas, que o "armazém" da minha fé não tem já muita coisa nova para vos dizer.
Contudo, e como bem notou um leitor amigo, eu estava a esquecer a importância do Espírito Santo. Por isso e como continuo com vontade, mais do que isso, necessidade de manter o Guia, e mantê-lo exactamente com o mesmo modelo que até aqui, confio que Ele há-de me iluminar e fornecer-me de conteúdo e ideias.
Às vezes deixo-me invadir pelas minhas deformações profissionais em coisas que nada tem a ver. E o meu fatal orgulho faz-me esquecer que a minha Fé não foi uma conquista minha mas sim uma graça que recebi.
Também recebi vários mails, alguns belíssimos, alguns trazendo-me notícias de pessoas que julgava já extraviadas. A todos eles, Maria, Marcus, Pedro, Rui, etc., a todos eles agradeço a preocupação e cuidado.
Mas queria dizer a todos estes meus amigos que, inadvertidamente, foram por mim induzidos em erro do qual peço desculpa e passo a explicar.
Começaria por dizer que o Guia tem sido uma benção para mim, particularmente num período difícil da minha vida. Já aqui expliquei porquê e mantenho tudo o que disse. O que acontece é que, como já repararam, o conteúdo do Guia é e pretende ser um só: a reflexão sobre a minha Fé. Logo à partida decidi que não iria falar aqui de política, de guerras, do Benfica, de cinema, do meu dia a dia, enfim de muitas coisas que são importantes para mim, mas que decidi não precisar de blogues para falar delas. E tenho-me mantido razoavelmente coerente com isso. Como tal e como diz um amigo blogger, este Guia é assumidamente confessional e não mais do que isso. E assim continuará. E é aqui que a dificuldade surge.
A questão que coloquei na 6ª feira passada tem precisamente a ver com isto. É certo que a minha Fé é razoavelmente forte e tem-se fortalecido através do Guia. Mas é igualmente certo que os meus recursos teológicos são limitados. Não sou padre nem seminarista nem estudante de Teologia. Só tenho a catequese da 1ª comunhão, nem crismado sou.
Já li uma pequena parteda Bíblia, já li bastantes livros sobre o Cristianismo, um pouco de história das religiões, um pouco sobre outras religiões, mas a minha disponibilidade de tempo e de espírito para ler é (cada vez mais) limitada.
Não é pois um problema de falta de fé nem de ânimo (o qual contudo melhorou bastante este fim de semana pelas mensagens recebidas): é, prosaicamente, um problema de falta de matéria-prima. Na 6ªfeira senti, como já senti noutras alturas, que o "armazém" da minha fé não tem já muita coisa nova para vos dizer.
Contudo, e como bem notou um leitor amigo, eu estava a esquecer a importância do Espírito Santo. Por isso e como continuo com vontade, mais do que isso, necessidade de manter o Guia, e mantê-lo exactamente com o mesmo modelo que até aqui, confio que Ele há-de me iluminar e fornecer-me de conteúdo e ideias.
Às vezes deixo-me invadir pelas minhas deformações profissionais em coisas que nada tem a ver. E o meu fatal orgulho faz-me esquecer que a minha Fé não foi uma conquista minha mas sim uma graça que recebi.
domingo, março 14, 2004
Momento "Cesário Borga", cá no Guia
Já se sabia que o poder não se transmite, conquista-se. Também já se disse que nos dias de hoje, em democracia, o poder não se conquista, perde-se. Agora a novidade é que pode ser perdido em dois dias.
Esperemos que quem o apanhe faça o que deve fazer.
Esperemos que quem o apanhe faça o que deve fazer.
sexta-feira, março 12, 2004
Omni phoenum
Fez ontem exactamente 6 meses que fiz o primeiro post aqui no Guia. Lembro-me bem porque era 11 de Setembro. Para assinalar este acontecimento (?) tinha preparado uma coisita para postar ontem mas perante os acontecimentos de Madrid achei mais adequado mandá-la para o Recycle Bin...
Por outro lado li também ontem o Fernando a falar sabiamente de razão a mais na nossa fé e e a citar S.Boaventura: "Não é necessário deitar no vinho da Escritura tanta água filosófica que o vinho se transforme em água; seria uma mistura bem triste!"
Foi então que esvaziei o Recycle Bin...
E pergunto-me hoje: por quanto tempo mais terei algo a dizer por aqui?
Act.: mas não se preocupem pois surgiu aí alguém que tem muito para dizer. E o fundamental é que haja sempre alguém a dizê-Lo.
Por outro lado li também ontem o Fernando a falar sabiamente de razão a mais na nossa fé e e a citar S.Boaventura: "Não é necessário deitar no vinho da Escritura tanta água filosófica que o vinho se transforme em água; seria uma mistura bem triste!"
Foi então que esvaziei o Recycle Bin...
E pergunto-me hoje: por quanto tempo mais terei algo a dizer por aqui?
Act.: mas não se preocupem pois surgiu aí alguém que tem muito para dizer. E o fundamental é que haja sempre alguém a dizê-Lo.
Teodicéia*, por e para um Zé Ninguém
Um dia, não há muito tempo, num daqueles dias sem luz e sem amanhã, fui a uma igreja e sentei-me. Tremia por dentro e queria rezar, mas não consegui.
Ergui os olhos e perguntei a Deus: Porquê eu? Porquê a mim? Que mal fiz eu? Mereço eu isto?
Como habitualmente, o silêncio parecia ser a resposta. Até que, de dentro de mim, ouvi algo que me perguntava: Porque não tu? Quem és tu? Alguém acima dos teus irmãos? Mereces mais do que os outros? Mereces aquilo que até aqui te tem sido dado?
Fez-se de novo silêncio em mim. E veio uma grande paz que apagou toda a dor, toda a revolta.
E repeti então as velhas palavras que são toda uma oração: “Faça-se em mim segundo a Tua vontade”.
E logo saí, melhor do que entrei, em paz comigo e com Deus. Pronto a aceitar o meu destino, qualquer que ele fosse, pronto a tentar ser digno dele, ou melhor, digno nele.
Uns dias mais tarde soube que, afinal, talvez houvesse amanhã para mim. O alívio que senti então nada foi perante aquele alívio que senti naquela igreja.
Esse alívio é o que ainda hoje perdura.
( * justiça na acção divina, explicação do mal ser permitido por Deus)
Ergui os olhos e perguntei a Deus: Porquê eu? Porquê a mim? Que mal fiz eu? Mereço eu isto?
Como habitualmente, o silêncio parecia ser a resposta. Até que, de dentro de mim, ouvi algo que me perguntava: Porque não tu? Quem és tu? Alguém acima dos teus irmãos? Mereces mais do que os outros? Mereces aquilo que até aqui te tem sido dado?
Fez-se de novo silêncio em mim. E veio uma grande paz que apagou toda a dor, toda a revolta.
E repeti então as velhas palavras que são toda uma oração: “Faça-se em mim segundo a Tua vontade”.
E logo saí, melhor do que entrei, em paz comigo e com Deus. Pronto a aceitar o meu destino, qualquer que ele fosse, pronto a tentar ser digno dele, ou melhor, digno nele.
Uns dias mais tarde soube que, afinal, talvez houvesse amanhã para mim. O alívio que senti então nada foi perante aquele alívio que senti naquela igreja.
Esse alívio é o que ainda hoje perdura.
( * justiça na acção divina, explicação do mal ser permitido por Deus)
terça-feira, março 09, 2004
Pai para sempre
É hoje um lugar-comum dizer que a família já não é o que era. Uma multidão de factores tem concorrido para que assim seja. Diz-se que o crescente secularismo da sociedade tem contribuído para isso, mas não estou certo que seja a principal razão. Não há dúvida porém que todas as religiões tem a família como preocupação central. E não é estranho que assim seja. Deus quer o melhor para o homem, não só para cada um, mas para o conjunto dos homens. Ora é por demais evidente a importância da família na construção humana, na estruturação social e individual. Sendo assim Deus só pode querer mais família. E isso é percebível desde o início – a Bíblia, no fundo, é uma história de famílias; o povo escolhido tem a sua representação inicial numa família; a aliança com Deus foi mantida através de elos familiares.
Mas isto fica para outros posts. Daquilo que eu quero falar hoje é do papel de pai hoje. Quando digo pai quero dizer pai mesmo, o fornecedor do cromossoma Y.
À medida que se foram rearranjando e uniformizando os papéis do homem e da mulher nas novas famílias houve, surgiu uma coisa excelente que foi o reaparecimento da figura do Pai, junto dos filhos. O pai deixou de ser uma figura distante e majestática, aproximou-se dos filhos, começou a mudar-lhes as fraldas e a acordar durante a noite por causa deles. E que coisa excelente que é tudo isso! É bom para os filhos e óptimo para nós pais que assim gozamos o nosso papel dez vezes mais do que os nossos avôs.
Houve de certa forma uma miscigenação do nosso papel com o papel de Mãe, pelo menos na educação e convívio diário com as crianças. As mães passaram a ter o mesmo pouco tempo do que nós e nós passámos a ter a mesma disponibilidade do que elas. Este facto parece-me uma coisa excelente e que devia ser socialmente preservada. Apesar disso, contrariando totalmente esta tendência, uma das raras que são mais oportunidade do que ameaça, parece que juridicamente os direitos dos pais a serem e permanecerem pais são ameaçados. Pelo menos para os nossos tribunais de família, quando decidem custódias dos filhos em caso de divórcio. Pior do que custódias: os regimes de visitas e de guarda. Às vezes mesmo que pai e mãe queiram ambos a guarda conjunta o meritíssimo juíz cria as maiores dificuldades!
Vem isto a propósito do que escreve hoje o Vincent. Estou inteiramente com ele quando diz “Quando se perde a convivência diária com os filhos, o buraco que fica nunca poderá ser tapado”. Nunca experimentei isso mas tenho a certeza de que é assim mesmo. E, enquanto cristão, orgulho-me em ouvir outro cristão a dizer: “Apetece dizer 'não perdoar', 'não esquecer'...mas, graças a Deus, isso já não está em mim. Direi antes 'dia a dia'. E repetirei 'dia a dia'. E repetirei 'dia a dia' as vezes que for preciso, nem que durante 20 anos o tenha de fazer, até que a dor já não seja rancor e eu tenha tirado o barrote da minha vista”. Ser cristão também é isto.
Mas isto fica para outros posts. Daquilo que eu quero falar hoje é do papel de pai hoje. Quando digo pai quero dizer pai mesmo, o fornecedor do cromossoma Y.
À medida que se foram rearranjando e uniformizando os papéis do homem e da mulher nas novas famílias houve, surgiu uma coisa excelente que foi o reaparecimento da figura do Pai, junto dos filhos. O pai deixou de ser uma figura distante e majestática, aproximou-se dos filhos, começou a mudar-lhes as fraldas e a acordar durante a noite por causa deles. E que coisa excelente que é tudo isso! É bom para os filhos e óptimo para nós pais que assim gozamos o nosso papel dez vezes mais do que os nossos avôs.
Houve de certa forma uma miscigenação do nosso papel com o papel de Mãe, pelo menos na educação e convívio diário com as crianças. As mães passaram a ter o mesmo pouco tempo do que nós e nós passámos a ter a mesma disponibilidade do que elas. Este facto parece-me uma coisa excelente e que devia ser socialmente preservada. Apesar disso, contrariando totalmente esta tendência, uma das raras que são mais oportunidade do que ameaça, parece que juridicamente os direitos dos pais a serem e permanecerem pais são ameaçados. Pelo menos para os nossos tribunais de família, quando decidem custódias dos filhos em caso de divórcio. Pior do que custódias: os regimes de visitas e de guarda. Às vezes mesmo que pai e mãe queiram ambos a guarda conjunta o meritíssimo juíz cria as maiores dificuldades!
Vem isto a propósito do que escreve hoje o Vincent. Estou inteiramente com ele quando diz “Quando se perde a convivência diária com os filhos, o buraco que fica nunca poderá ser tapado”. Nunca experimentei isso mas tenho a certeza de que é assim mesmo. E, enquanto cristão, orgulho-me em ouvir outro cristão a dizer: “Apetece dizer 'não perdoar', 'não esquecer'...mas, graças a Deus, isso já não está em mim. Direi antes 'dia a dia'. E repetirei 'dia a dia'. E repetirei 'dia a dia' as vezes que for preciso, nem que durante 20 anos o tenha de fazer, até que a dor já não seja rancor e eu tenha tirado o barrote da minha vista”. Ser cristão também é isto.
segunda-feira, março 08, 2004
Deus ex-machina
Disse-nos ontem o Evangelho do 2º Domingo da Quaresma (Lucas 9,28-36):
“Uns oito dias depois destas palavras, levando consigo Pedro, João e Tiago, Jesus subiu ao monte para orar. Enquanto orava, o aspecto do seu rosto modificou-se, e as suas vestes tornaram-se de uma brancura fulgurante. E dois homens conversavam com Ele: Moisés e Elias, os quais, aparecendo rodeados de glória, falavam da sua morte, que ia acontecer em Jerusalém. Pedro e os companheiros estavam a cair de sono; mas, despertando, viram a glória de Jesus e os dois homens que estavam com Ele. Quando eles iam separar-se de Jesus, Pedro disse-lhe: «Mestre, é bom estarmos aqui. Façamos três tendas: uma para ti, uma para Moisés e outra para Elias.» Não sabia o que estava a dizer. Enquanto dizia isto, surgiu uma nuvem que os cobriu e, quando entraram na nuvem, ficaram atemorizados. E da nuvem veio uma voz que disse: «Este é o meu Filho muito amado. Escutai-o.» Quando a voz se fez ouvir, Jesus ficou só. Os discípulos guardaram silêncio e, naqueles dias, nada contaram a ninguém do que tinham visto”.
Esta passagem da Transfiguração de Cristo, referida na Bíblia em pelo menos mais dois trechos: Mateus 17, 1-9 e 2ª Carta de Pedro 1, 16-18, é um episódio que sempre me provocou alguma estranheza. Não pelo episódio em si mas pela projecção relativamente pequena que a Igreja lhe atribuiu no corpo da doutrina cristã. Não será certamente pela incerteza do episódio: vem mencionado em dois dos evangelhos e é referido por uma das testemunhas presenciais, Pedro. Também não o será pela falta de significado teológico: no final de contas revela-se aqui a três homens escolhidos e de uma forma sensível a natureza divina de Cristo!
Talvez a importância menor que se dá a este episódio na doutrina da Igreja tenha paralelismo com a importância menor que Cristo também quiz dar-lhe: no fim de contas deixou que ele ocorresse no cimo dum monte com apenas três testemunhas em vez de optar por uma manifestação espetacular perante a multidão. Imagine-se a sensação se esta manifestação de esplendor divino tivesse ocorrido durante o julgamento ou durante o calvário de Cristo! Mas não foi definitivamente assim que Deus quiz revelar a sua mensagem aos homens. Deus não deixou a vida de Cristo terminar à moda das tragédias gregas, recusou o clássico papel do “deus ex-machina”. Não, o que Deus quiz mostrar ao homens não foi o poder da sua magnificência mas a imensidade do seu amor por nós. Não resgatou espetacularmente o Seu Filho da Cruz mas deixou-o morrer lá, às nossas mãos, como se fosse qualquer um de nós. Em vez de nos ter deixado deslumbrados com a Sua grandeza, escolheu deixar-nos a imagem de Jesus que viveu absolutamente de acordo com a Sua Palavra. Escolheu deixar-nos perante o facto de o Seu Filho ter nascido e vivido no meio de nós, ter-nos oferecido a Palavra de Deus e ter sido rejeitado por isso. Definitivamente Deus não procura convencer a nossa inteligência mas procura, isso sim, converter o nosso coração. E converter significa transformar. Peço desculpa mas lá estou eu a insistir no significado central e transcendente da Paixão de Cristo: para mim o episódio furtivo da transfiguração não é mais do que mais um elemento para entendermos plenamente o significado da Paixão, para entendermos mais perfeitamente a relação que Deus quer ter connosco.
Penso que não estou a inventar nada de novo. Descubro agora mesmo uma oração da liturgia ortodoxa que diz isto mesmo. É o Kondákion:
Tu te transfiguraste sobre o Monte,
ó Cristo, nosso Deus,
revelando a tua glória aos teus discípulos,
tanto quanto lhes era possível contemplá-la,
a fim de que,
quando te vissem crucificado, compreendessem
que aceitaste livremente a tua Paixão,
e anunciassem ao mundo
que és, em verdade, o Esplendor do Pai.
“Uns oito dias depois destas palavras, levando consigo Pedro, João e Tiago, Jesus subiu ao monte para orar. Enquanto orava, o aspecto do seu rosto modificou-se, e as suas vestes tornaram-se de uma brancura fulgurante. E dois homens conversavam com Ele: Moisés e Elias, os quais, aparecendo rodeados de glória, falavam da sua morte, que ia acontecer em Jerusalém. Pedro e os companheiros estavam a cair de sono; mas, despertando, viram a glória de Jesus e os dois homens que estavam com Ele. Quando eles iam separar-se de Jesus, Pedro disse-lhe: «Mestre, é bom estarmos aqui. Façamos três tendas: uma para ti, uma para Moisés e outra para Elias.» Não sabia o que estava a dizer. Enquanto dizia isto, surgiu uma nuvem que os cobriu e, quando entraram na nuvem, ficaram atemorizados. E da nuvem veio uma voz que disse: «Este é o meu Filho muito amado. Escutai-o.» Quando a voz se fez ouvir, Jesus ficou só. Os discípulos guardaram silêncio e, naqueles dias, nada contaram a ninguém do que tinham visto”.
Esta passagem da Transfiguração de Cristo, referida na Bíblia em pelo menos mais dois trechos: Mateus 17, 1-9 e 2ª Carta de Pedro 1, 16-18, é um episódio que sempre me provocou alguma estranheza. Não pelo episódio em si mas pela projecção relativamente pequena que a Igreja lhe atribuiu no corpo da doutrina cristã. Não será certamente pela incerteza do episódio: vem mencionado em dois dos evangelhos e é referido por uma das testemunhas presenciais, Pedro. Também não o será pela falta de significado teológico: no final de contas revela-se aqui a três homens escolhidos e de uma forma sensível a natureza divina de Cristo!
Talvez a importância menor que se dá a este episódio na doutrina da Igreja tenha paralelismo com a importância menor que Cristo também quiz dar-lhe: no fim de contas deixou que ele ocorresse no cimo dum monte com apenas três testemunhas em vez de optar por uma manifestação espetacular perante a multidão. Imagine-se a sensação se esta manifestação de esplendor divino tivesse ocorrido durante o julgamento ou durante o calvário de Cristo! Mas não foi definitivamente assim que Deus quiz revelar a sua mensagem aos homens. Deus não deixou a vida de Cristo terminar à moda das tragédias gregas, recusou o clássico papel do “deus ex-machina”. Não, o que Deus quiz mostrar ao homens não foi o poder da sua magnificência mas a imensidade do seu amor por nós. Não resgatou espetacularmente o Seu Filho da Cruz mas deixou-o morrer lá, às nossas mãos, como se fosse qualquer um de nós. Em vez de nos ter deixado deslumbrados com a Sua grandeza, escolheu deixar-nos a imagem de Jesus que viveu absolutamente de acordo com a Sua Palavra. Escolheu deixar-nos perante o facto de o Seu Filho ter nascido e vivido no meio de nós, ter-nos oferecido a Palavra de Deus e ter sido rejeitado por isso. Definitivamente Deus não procura convencer a nossa inteligência mas procura, isso sim, converter o nosso coração. E converter significa transformar. Peço desculpa mas lá estou eu a insistir no significado central e transcendente da Paixão de Cristo: para mim o episódio furtivo da transfiguração não é mais do que mais um elemento para entendermos plenamente o significado da Paixão, para entendermos mais perfeitamente a relação que Deus quer ter connosco.
Penso que não estou a inventar nada de novo. Descubro agora mesmo uma oração da liturgia ortodoxa que diz isto mesmo. É o Kondákion:
Tu te transfiguraste sobre o Monte,
ó Cristo, nosso Deus,
revelando a tua glória aos teus discípulos,
tanto quanto lhes era possível contemplá-la,
a fim de que,
quando te vissem crucificado, compreendessem
que aceitaste livremente a tua Paixão,
e anunciassem ao mundo
que és, em verdade, o Esplendor do Pai.
quinta-feira, março 04, 2004
Dia da voz
Durante muitos anos fui vizinho duma Igreja Evangélica Baptista. Ela situava-se, como seria de esperar, na garagem do nosso prédio e o pastor e sua família viviam num apartamento 2 ou 3 andares abaixo do nosso. Às 4ªs feiras à noite e aos domingos de manhã eles tinham as suas celebrações e depois vinham para a rua onde ficavam, em grupos de 40-50 pessoas, a conversar animadamente como se reencontrassem após uma longa ausência.
Do pouco que deles conheci ficou a impressão de serem excelentes pessoas e a impressão de neles ver uma alegria e espírito de comunidade que não reconhecia na minha missa paroquial.
Mas esta visão positiva que deles tinha nunca deixou de ter um travo paternalista. Nos dias em que a tampa do terraço ficava aberta o vozeirão enfático do Pastor chegava à janela do meu quarto e por vezes eu ficava ali um pouco a sorrir-me da extraordinária diferença entre o pastor pregante e o pacatíssimo vizinho com que me cruzava no elevador. Sorria também, às vezes, da doutrina que entrevia naqueles sermões ruidosos, da música, das palmas.
Já depois de a minha família ter mudado de casa, soube que aquela Igreja prosperou e acabou por ocupar o prédio todo. Fiquei satisfeito mas a condescendência manteve-se comigo.
Mais tarde, depois de ter começado a aprofundar a minha fé, pelo estudo da história do Cristianismo, comecei então a ter alguma noção sobre o protestantismo, sobre as suas origens e razões. E, por os começar a conhecer comecei a vê-los como uma forma de Cristianismo tão válida como a minha. Mas os Evangélicos Baptistas, esses, e depois de ter conhecido as suas extraordinárias igrejas televisivas dos Estados Unidos, continuei a manter uma forte reserva intelectual quanto a eles.
Mas um dia entrei na blogosfera e conheci a Voz do Tiago Cavaco e a minha visão dos evangélicos e do seu pensamento mudou radicalmente.
Mais tarde os irmãos Bengelsdorff, os Samuéis dos Animais e outros Tiagos que por aí surgiram, fizeram com que, hoje, este católico apostólico romano tenha varrido da sua mente todo o paternalismo que sentia pelos evangélicos. Eles tem defeitos e limitações mas isso não falta também nos católicos, luteranos, anglicanos, presbiterianos, metodistas, etc.
Hoje já não lhes desdenho a doutrina mas invejo-lhes a vitalidade.
Hoje reconheço-os como irmãos e iguais na Fé em Cristo.
Hoje faz um ano que a Voz começou a ecoar por aí. Obrigado Tiago, e muitos parabéns.
Do pouco que deles conheci ficou a impressão de serem excelentes pessoas e a impressão de neles ver uma alegria e espírito de comunidade que não reconhecia na minha missa paroquial.
Mas esta visão positiva que deles tinha nunca deixou de ter um travo paternalista. Nos dias em que a tampa do terraço ficava aberta o vozeirão enfático do Pastor chegava à janela do meu quarto e por vezes eu ficava ali um pouco a sorrir-me da extraordinária diferença entre o pastor pregante e o pacatíssimo vizinho com que me cruzava no elevador. Sorria também, às vezes, da doutrina que entrevia naqueles sermões ruidosos, da música, das palmas.
Já depois de a minha família ter mudado de casa, soube que aquela Igreja prosperou e acabou por ocupar o prédio todo. Fiquei satisfeito mas a condescendência manteve-se comigo.
Mais tarde, depois de ter começado a aprofundar a minha fé, pelo estudo da história do Cristianismo, comecei então a ter alguma noção sobre o protestantismo, sobre as suas origens e razões. E, por os começar a conhecer comecei a vê-los como uma forma de Cristianismo tão válida como a minha. Mas os Evangélicos Baptistas, esses, e depois de ter conhecido as suas extraordinárias igrejas televisivas dos Estados Unidos, continuei a manter uma forte reserva intelectual quanto a eles.
Mas um dia entrei na blogosfera e conheci a Voz do Tiago Cavaco e a minha visão dos evangélicos e do seu pensamento mudou radicalmente.
Mais tarde os irmãos Bengelsdorff, os Samuéis dos Animais e outros Tiagos que por aí surgiram, fizeram com que, hoje, este católico apostólico romano tenha varrido da sua mente todo o paternalismo que sentia pelos evangélicos. Eles tem defeitos e limitações mas isso não falta também nos católicos, luteranos, anglicanos, presbiterianos, metodistas, etc.
Hoje já não lhes desdenho a doutrina mas invejo-lhes a vitalidade.
Hoje reconheço-os como irmãos e iguais na Fé em Cristo.
Hoje faz um ano que a Voz começou a ecoar por aí. Obrigado Tiago, e muitos parabéns.
Anti-semitismo ou semitismo anti ?
Pois é. Ainda ontem disse aqui que não ia mais referir-me ao tal assunto. Acontece porém que o meu leitor e amigo Marcus Pimenta me pôs na pista dumas sensatas declarações do rabino americano Daniel Lapin e que aconselho todos a lerem com atenção neste sítio. Não faço a mínima ideia de qual será a representatividade deste rabino na Judiaria Americana, presumo até que seja pouca. Mas o que ele diz parece-me ser do maior bom senso e vai ao encontro das preocupações dum cristão filo-semita como eu.
Destaco apenas alguns trechos: "Those Jewish organizations that have squandered both time and money futilely protesting Passion, ostensibly in order to prevent pogroms in Pittsburgh, can hardly be proud of their performance. They failed at everything they attempted. They were hoping to ruin Gibson rather than enrich him. They were hoping to suppress Passion rather than promote it. Finally, they were hoping to help Jews rather than harm them."; "I am encountering bitterness at Jewish organizations insisting that belief in the New Testament is de facto evidence of anti-Semitism."; "Listen to a rabbi whom I debated on the Fox television show hosted by Bill O'Reilly last September. This is what he said, "We have a responsibility as Jews, as thinking Jews, as people of theology, to respond to our Christian brothers and to engage them, be it Protestants, be it Catholics, and say, look, this is not your history, this is not your theology, this does not represent what you believe in."He happens to be a respected rabbi and a good one, but he too has bought into the preposterous proposition that Jews will reeducate Christians about Christian theology and history. Is it any wonder that this breathtaking arrogance spurs bitterness?"; " One of the directors of the AJC recently warned that Passion "could undermine the sense of community between Christians and Jews that's going on in this country. We're not allowing the film to do that." No sir, it isn't the film that threatens the sense of community; it is the arrogant and intemperate response of Jewish organizations that does so."
Gostaria muito de saber a opinião do meu amigo Nuno e também do Francisco sobre o que este judeu americano diz.
Destaco apenas alguns trechos: "Those Jewish organizations that have squandered both time and money futilely protesting Passion, ostensibly in order to prevent pogroms in Pittsburgh, can hardly be proud of their performance. They failed at everything they attempted. They were hoping to ruin Gibson rather than enrich him. They were hoping to suppress Passion rather than promote it. Finally, they were hoping to help Jews rather than harm them."; "I am encountering bitterness at Jewish organizations insisting that belief in the New Testament is de facto evidence of anti-Semitism."; "Listen to a rabbi whom I debated on the Fox television show hosted by Bill O'Reilly last September. This is what he said, "We have a responsibility as Jews, as thinking Jews, as people of theology, to respond to our Christian brothers and to engage them, be it Protestants, be it Catholics, and say, look, this is not your history, this is not your theology, this does not represent what you believe in."He happens to be a respected rabbi and a good one, but he too has bought into the preposterous proposition that Jews will reeducate Christians about Christian theology and history. Is it any wonder that this breathtaking arrogance spurs bitterness?"; " One of the directors of the AJC recently warned that Passion "could undermine the sense of community between Christians and Jews that's going on in this country. We're not allowing the film to do that." No sir, it isn't the film that threatens the sense of community; it is the arrogant and intemperate response of Jewish organizations that does so."
Gostaria muito de saber a opinião do meu amigo Nuno e também do Francisco sobre o que este judeu americano diz.
quarta-feira, março 03, 2004
Tentações 2
Deve ser fruto da época, quero dizer da Quaresma (e não só, como todos percebemos), mas o meu post sobre as tentações de Cristo suscitou um inusitado fluxo de mails aqui para o Guia.
Àqueles mais interpelativos quero apenas dizer que a minha intenção não foi chamar de novo o estafado assunto do filme de Gibson. Já disse que esse assunto está encerrado no meu blogue. Se assim não fosse acabava por não ir ver o filme, o que era uma pena. Não. Se falei das tentações foi simplesmente porque decidi que este ano, já que tenho o Guia, vou finalmente viver a Quaresma como um cristão deve vivê-la, isto é, meditando sobre o seu significado para a minha Fé. Por isso será possível que às 2ªs ou 3ªs feiras deste período eu me permita fazer uns postezitos reflectindo sobre o Evangelho do domingo anterior. Ficam pois avisados.
Seja como fôr surgiram-me aqui várias perguntas interessantes. Talvez a mais interessante de todas foi a do meu estimado amigo Fernando do cada vez mais excelente A Bordo, que me perguntou algo muito simples e muito complicado: o que me levou a colocar a segunda tentação na categoria de “parecer”?
Ora bem. Tenho para mim que o episódio das tentações é essencialmente a confrontação de Jesus com a sua dupla natureza, humana e divina. É nesse episódio que Jesus resolve esta questão duma forma quase definitiva: mantendo sempre a consciência da sua relação com Deus aceita sujeitar-se às contingências e leis humanas por forma a que se cumprisse a sua missão na Terra.
Voltando ao episódio, eu penso que o Diabo (seja o que isso fôr!), consciente dessa dualidade entre a profunda divindade e a profunda humanidade de Cristo, tenta-O por forma a destruir o equilíbrio dessa dualidade. Isto é, com uma mão relembra a Jesus as suas necessidades e anseios de homem e com a outra acena-lhe com a Sua omnipotência divina. E propõe a Jesus pôr esta ao serviço daquelas por forma a negar a Deus o propósito último da encarnação do Seu Filho.
É este episódio das tentações que me fez entender um pouco melhor o mistério da natureza encarnada de Cristo.
E é nesta perspectiva que entendo a segunda tentação. O Diabo (seja o que isso fôr!) mostra ao homem Jesus todos os reinos do mundo e diz-lhe que está ao alcance da Sua natureza ser Senhor de todos eles, parecer ser Ele o Deus e não o Filho de Deus, qualidade essa com que foi nos enviado. Dir-se-ia, e perdoem-me a ligeireza, que o Diabo (seja o que isso fôr!) quis lançar a desordem na Trindade Divina. É verdadeiramente aqui que Cristo nos mostra que veio exclusivamente para cumprir a vontade do Pai. E foi o que Ele fez.
Esta tentação do parecer, parecer Deus, é verdadeiramente a mais perigosa para o Homem. É ela o pecado original, pelo qual Adão e Eva foram simbolicamente punidos. Cristo, consubstancial a Deus, conseguiu resistir-lhe. Por maioria de razões nós, simples criaturas, também devemos consegui-lo.
Pensando em tudo isto descobri que o episódio das tentações de Cristo tem um significado teológico muito maior do que supunha até Domingo passado. Como me diz o Fernando este episódio “leva-nos directamente para a teologia e para o modo como entendemos a história, o sentido, e a relação de Jesus com Deus”. Exactamente. E como este meu amigo relembra: “Dostoievski justificava a sua crença em Deus pelo facto de as três tentações terem sido escritas”.
Àqueles mais interpelativos quero apenas dizer que a minha intenção não foi chamar de novo o estafado assunto do filme de Gibson. Já disse que esse assunto está encerrado no meu blogue. Se assim não fosse acabava por não ir ver o filme, o que era uma pena. Não. Se falei das tentações foi simplesmente porque decidi que este ano, já que tenho o Guia, vou finalmente viver a Quaresma como um cristão deve vivê-la, isto é, meditando sobre o seu significado para a minha Fé. Por isso será possível que às 2ªs ou 3ªs feiras deste período eu me permita fazer uns postezitos reflectindo sobre o Evangelho do domingo anterior. Ficam pois avisados.
Seja como fôr surgiram-me aqui várias perguntas interessantes. Talvez a mais interessante de todas foi a do meu estimado amigo Fernando do cada vez mais excelente A Bordo, que me perguntou algo muito simples e muito complicado: o que me levou a colocar a segunda tentação na categoria de “parecer”?
Ora bem. Tenho para mim que o episódio das tentações é essencialmente a confrontação de Jesus com a sua dupla natureza, humana e divina. É nesse episódio que Jesus resolve esta questão duma forma quase definitiva: mantendo sempre a consciência da sua relação com Deus aceita sujeitar-se às contingências e leis humanas por forma a que se cumprisse a sua missão na Terra.
Voltando ao episódio, eu penso que o Diabo (seja o que isso fôr!), consciente dessa dualidade entre a profunda divindade e a profunda humanidade de Cristo, tenta-O por forma a destruir o equilíbrio dessa dualidade. Isto é, com uma mão relembra a Jesus as suas necessidades e anseios de homem e com a outra acena-lhe com a Sua omnipotência divina. E propõe a Jesus pôr esta ao serviço daquelas por forma a negar a Deus o propósito último da encarnação do Seu Filho.
É este episódio das tentações que me fez entender um pouco melhor o mistério da natureza encarnada de Cristo.
E é nesta perspectiva que entendo a segunda tentação. O Diabo (seja o que isso fôr!) mostra ao homem Jesus todos os reinos do mundo e diz-lhe que está ao alcance da Sua natureza ser Senhor de todos eles, parecer ser Ele o Deus e não o Filho de Deus, qualidade essa com que foi nos enviado. Dir-se-ia, e perdoem-me a ligeireza, que o Diabo (seja o que isso fôr!) quis lançar a desordem na Trindade Divina. É verdadeiramente aqui que Cristo nos mostra que veio exclusivamente para cumprir a vontade do Pai. E foi o que Ele fez.
Esta tentação do parecer, parecer Deus, é verdadeiramente a mais perigosa para o Homem. É ela o pecado original, pelo qual Adão e Eva foram simbolicamente punidos. Cristo, consubstancial a Deus, conseguiu resistir-lhe. Por maioria de razões nós, simples criaturas, também devemos consegui-lo.
Pensando em tudo isto descobri que o episódio das tentações de Cristo tem um significado teológico muito maior do que supunha até Domingo passado. Como me diz o Fernando este episódio “leva-nos directamente para a teologia e para o modo como entendemos a história, o sentido, e a relação de Jesus com Deus”. Exactamente. E como este meu amigo relembra: “Dostoievski justificava a sua crença em Deus pelo facto de as três tentações terem sido escritas”.
terça-feira, março 02, 2004
Frase para um capitalista relutante
Vinha hoje de manhã cedo para o escritório quando ouvi na TSF: "Hoje o capitalismo já não explora os pobres: ignora-os."
Há verdades que nos gritam.
Há verdades que nos gritam.